domingo, 24 de dezembro de 2017

DINDINHA DINOCA, MINHA QUERIDA VÓ

PROFECIAS


Ontem, alguma coisa que aconteceu, um incidente qualquer, detonou duas lembranças dentro de mim. Lembranças muito antigas que estavam adormecidas. Engraçado, ainda agora estou me lembrando delas, mas do incidente que promoveu a retirada delas de uma gaveta que se encontra no fundo da memória, ah! Isso não consigo recordar, por mais esforços que faça. Bem, vou contar as recordações antigas e, quem sabe, acabo acordando o evento de ontem.
Quando ainda tinha cinco anos... assim contou minha mãe quando eu estava na adolescência e entrei em casa com minha primeira namorada. Disse que, certo dia, minha avó, Dindinha Dinoca, como a chamávamos, profetizou aos presentes na cozinha de sua casa, com um entusiasmo muito grande, olhando para mim:
- Esse meu netinho vai ser padre.
Minha mãe disse que eu não dei tempo a ninguém para se expressar a respeito desse augúrio que me fazia a vó beata, que se sentia frustrada de ainda não ter nenhum neto com inclinação para o sacerdócio. A minha resposta foi tão firme quanto rápida e criou um silêncio tumular.
- Eu não, eu vou casar!
Meu pai riu seu riso de boca fechada, porque tinha muito respeito à sogra, mas pareceu ficar feliz com minha resposta. Minha mãe ficou impassível, mas contou-me anos depois que também não gostou do prognóstico de Dindinha. Vovó ficou triste comigo, mas teve um consolo anos depois porque outro neto, Zito, dos Rezendes ingressou no seminário.
Creio que um ano e pouco se passou depois desse evento, e até hoje me lembro sem ter precisado que alguém me contasse, eu e minha vó estávamos no quintal daquela casa em que viveram os últimos anos em Santa Bárbara. Já era noite e o ar estava agradável e perfumado pelas diversas plantas do quintal amplo. Era noite de lua cheia e ela subia vaidosa e imponente, pouco além da linha do horizonte, exibindo sua elegância e encanto. Não se ouvia nem a respiração de quem estava perto. Eu quebrei aquele encanto com um presságio realista que se confirmaria anos depois da morte de meus avós:
- Dindinha, um dia o homem ainda vai pisar na lua.
- Não fala bobagem menino, se Deus pôs a lua tão alto é pra gente não pisar nela.
Não estou muito seguro, mas parece-me que levei um tapa na boca, nada forte, mas que me fez ficar calado o resto da noite. E dezenas de anos depois, casado e com filhos, vi na televisão de casa, com as crianças e a esposa, o primeiro homem pisar na lua; pensei com meus botões;
- Caramba! Eu tinha razão.
(Inédito, 24 de dezembro de 2017. Geraldo Chacon)


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