terça-feira, 21 de novembro de 2017

ELEGIA

Quando minha mãe faleceu, minha irmã Alaíde questionou-me por ter feito poema para meu pai, com quem sempre vivia brigando, e nada fizera para minha mãe. Não soube responder, eu mesmo não entendia o porquê, nem mesmo havia pensado no assunto. Minha mãe sempre fora tudo para mim, sinto que tudo que consegui na vida foi por tê-la ouvido e também porque ela acreditava em mim e não gostaria de decepcioná-la.
A pergunta levou-me a pensar em fazer uma elegia, tipo de poema antigo, do tempo da Grécia clássica, marcado por tristeza profunda. Dias depois veio a inspiração:

SALA VAZIA


Minha sala era vazia,
excelente para ginástica e para a gente descansar.
Minha mãe não vinha em casa
porque não tinha, dizia,
um lugar para se sentar.
Eu devia, pelo menos, colocar nela um sofá.

Comprei sofá, poltrona,
tapete, vaso, mesa de centro
e até uma gravura que pendurei na parede.
Minha mãe veio uma vez,
elogiou muito, adorou tudo:
"Está muito bonito!"

Mas nunca mais voltou,
ficou doente e partiu.
Agora não sei o que fazer
com tanta coisa inútil.

segunda-feira, 6 de novembro de 2017

O)s Lusíadas em Cabo Frio, visto por Jiddu Saldanha

      Quem viu, viu, quem não viu, perdeu. Um dos trabalhos mais surpreendentes dos últimos tempos, em Cabo Frio. O poeta, professor, escritor e ator Geraldo Chacon, abrilhantou nossa noite. Já tínhamos tido um gostinho quando ele apresentou uma versão resumida deste trabalho no FesTSolos IV. Um evento de solos teatrais que aconteceu nos dias 07, 08 e 09 de Julho. Foi uma apresentação que deixou um gostinho de quero mais e este “quero mais” aconteceu, justamente, este final de semana agora, dias 03 e 04 de Novembro no espaço cultural USIN4.
      Geraldo fez uma estilosa triangulação em cena. O espetáculo não tinha uma "gordurinha" sequer, ótima execução técnica, com boa iluminação e ambientação sonora de primeira. O texto de Camões, adaptado para ser ouvido, com uma maestria que poucas vezes vi. Um poema épico, adaptado para teatro é, sem dúvida, um grande desafio. Havia, também, no espetáculo, um humor fino e intelectual, é desses trabalhos que chama as pessoas de inteligente por tabela. O público sai se sentindo melhor e, claro, com orgulho da nossa pátria mãe portuguesa. Não é sempre que se tem um espetáculo consagrado à língua bem falada, por excelência, e tudo sem ser chato, professoral ou pedante.


      Angelah Dantas arrasou na direção. Deixou Geraldo solto em cena, mas com proposta de movimentação bem definida. As transições das personagens eram suaves e o ator mantinha uma palheta vocal que não passava cansaço ou ansiedade ao público. O trabalho terminou na hora certa e rendeu um gostoso bate-papo em que, Geraldo deixou fluir sua generosidade, distribuindo seus livros ao público que, depois, foi convidado pelos donos do espaço USIN4 a curtir uma rodada de conversa degustando as delícias da cantina “Catatempo". 

      Parabéns para toda a equipe "camoniana". Voltem sempre! Cabo Frio espera ainda ver mais deste tipo de linguagem. Quem sabe no "Poesia de Cena" de 2018? Vamos aguardar.