PROFECIAS
Ontem,
alguma coisa que aconteceu, um incidente qualquer, detonou duas lembranças
dentro de mim. Lembranças muito antigas que estavam adormecidas. Engraçado, ainda
agora estou me lembrando delas, mas do incidente que promoveu a retirada delas
de uma gaveta que se encontra no fundo da memória, ah! Isso não consigo
recordar, por mais esforços que faça. Bem, vou contar as recordações antigas e,
quem sabe, acabo acordando o evento de ontem.
Quando
ainda tinha cinco anos... assim contou minha mãe quando eu estava na
adolescência e entrei em casa com minha primeira namorada. Disse que, certo
dia, minha avó, Dindinha Dinoca, como a chamávamos, profetizou aos presentes na
cozinha de sua casa, com um entusiasmo muito grande, olhando para mim:
-
Esse meu netinho vai ser padre.
Minha
mãe disse que eu não dei tempo a ninguém para se expressar a respeito desse
augúrio que me fazia a vó beata, que se sentia frustrada de ainda não ter
nenhum neto com inclinação para o sacerdócio. A minha resposta foi tão firme
quanto rápida e criou um silêncio tumular.
-
Eu não, eu vou casar!
Meu
pai riu seu riso de boca fechada, porque tinha muito respeito à sogra, mas
pareceu ficar feliz com minha resposta. Minha mãe ficou impassível, mas
contou-me anos depois que também não gostou do prognóstico de Dindinha. Vovó ficou
triste comigo, mas teve um consolo anos depois porque outro neto, Zito, dos
Rezendes ingressou no seminário.
Creio
que um ano e pouco se passou depois desse evento, e até hoje me lembro sem ter
precisado que alguém me contasse, eu e minha vó estávamos no quintal daquela
casa em que viveram os últimos anos em Santa Bárbara. Já era noite e o ar
estava agradável e perfumado pelas diversas plantas do quintal amplo. Era noite
de lua cheia e ela subia vaidosa e imponente, pouco além da linha do horizonte,
exibindo sua elegância e encanto. Não se ouvia nem a respiração de quem estava
perto. Eu quebrei aquele encanto com um presságio realista que se confirmaria
anos depois da morte de meus avós:
-
Dindinha, um dia o homem ainda vai pisar na lua.
-
Não fala bobagem menino, se Deus pôs a lua tão alto é pra gente não pisar nela.
Não
estou muito seguro, mas parece-me que levei um tapa na boca, nada forte, mas
que me fez ficar calado o resto da noite. E dezenas de anos depois, casado e
com filhos, vi na televisão de casa, com as crianças e a esposa, o primeiro
homem pisar na lua; pensei com meus botões;
-
Caramba! Eu tinha razão.
(Inédito, 24 de dezembro de 2017. Geraldo Chacon)
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